domingo, 11 de abril de 2010

Diário semanal de Lucas 1 versos 5-7

"No tempo do Rei Herodes, Rei da Judéia, havia um sacerdote chamado Zacarias, da turma de Abias. Sua mulher, descendente de Aarão, chamava-se Isabel (no original e no inglês, Elisabete) Ambos eram justos diante de Deus e viviam irrepreensíveis em todos os mandamentos e ordens do Senhor. Mas não tinham filhos, pois Isabel  era estéril e ambos eram de idade avançada"

Sempre esta palavra. Sempre ela aparece em qualquer história humana.. O antigo Testamento está cheio dela. Deus cria o homem mas ele peca. O homem tenta chegar até o céu mas é confundido e espalhado pela variedade de línguas. Ló consegue escapar do castigo de Deus a Sodoma mas sua esposa não. Davi foi um homem segundo o coração de Deus mas mandou para a morte o marido da mulher que ele queria. E assim eu poderia falar horas e horas sobre estes mas que todos nós enfrentamos ou causamos. Pra mim o termo kai foi muito bem traduzido por mas aqui. Porém poderíamos dizer: E não tinham filhos...

Pois bem, Lucas introduz dois personagens para contar sua história de Cristo e é interessante ver como ele difere dos outros evangelhos no início da narrativa. Os três outros começam já falando da história de Cristo. Mateus de sua descendência, João de que ele era o verbo, Marcos com o cumprimento da profecia de Isaías. Mas Lucas começa com esses dois personagens. Responda rápido: são eles importantes pra você? Vamos ver. Lucas parece falar de dois personagens que vivem num conto de fadas - Zacarias era sacerdote, pessoa importante. Isabel, descendente do próprio Aarão do V.Testamento. Para completar, ambos eram justos diante de Deus. Parece perfeito, mas não é. Algo importantíssimo estava faltando. Aliás, algo sempre falta...eles não tinham filhos e eram avançados na idade. Sabe, pra mim é interessantíssimo o fato da bíblia dar destaque à incapacidade do homem, de tantas frustrações, de histórias puramente humanas, onde vemos claramente vidas tão frágeis, que lutam mas que precisam da intervenção de Deus. Pegue qualquer tempo da história humana e você verá que sempre Deus agiu. Aqui não vai ser diferente. Mas antes, temos esta situação aparentemente sem solução. Não é à toa que Zacarias duvidaria que seria pai. Eram velhos! Não existia UTI nem cesariana para diminuir o risco da gravidez de Isabel. Não havia aparelhos médicos. A própria medicina estava apenas engatinhando. Lucas trata logo de dizer isso porque logicamente ele não está contando um conto de fadas aqui mas uma história humana, real. Não temos sonhos fúteis, mas primordiais (não ter filhos na sociedade da época era terrível para uma mulher como Isabel, descendente do Aarão). Ah, um filho era muito importante para eles, com certeza, mas estavam velhos e por que arriscar a vida de Isabel agora, na velhice? Também não temos pessoas ricas aqui. Só Herodes, que depois ficaria conhecido por sua loucura. Não vemos nada fantasioso ou grandioso no começo desta história. Não temos estrelinhas no céu guiando, ou anjos falando. Não, não ainda. Percebeu?. Lucas parece preparar a história, a chegada do messias, a intervenção divina e o leitor com dois personagens humildes. Sim, gente humilde, como aquela antiga canção da MPB. Lucas dá destaque à vida espiritual deles, mas quero dar destaque hoje à parte física, humana. Eu faço questão de entrar no ambiente físico porque para o leitor de Lucas isso não é surpreendente, mas faz toda diferença hoje. Quer saber como? Quantos de nós já paramos pra pensar na vida destes dois personagens quando iniciamos a leitura de Lucas? Poucos, com certeza, e eu me incluo aqui. Só nestes tempos em que estive meditando sobre este texto é que me dei conta do quão importante eles são. 

Estamos tão acostumados com um evangelho consumista que a maioria de nós passa por cima destes dois personagens sem perceber, julgando-os desnecessários, sem importância. Acho que isto precisa ser revisto. Precisamos aprender um pouco mais sobre viver como cristão. Digo viver em todos os sentidos humanos - não egoístas - que este verbo implica. Aqui não há campanhas de oração nem sensacionalismo. Precisamos  parar com muitas coisas de hoje em dia que solapam o verdadeiro evangelho e uma autêntica vida cristã. Por exemplo, vamos começar com esta história de que somos especiais. OK, somos escolhidos sim, mas isto tem uma conotação horrível hoje em dia: somos escolhidos: vamos nos afastar da mediocridade! Esta terrível lógica esteve presente em todas as épocas em vários grupos religiosos que buscaram fugir do mundo para não se contaminar, não se misturar à chamada massa. Vamos parar com isso! Vamos parar com este evangelho elitisado, cheio de pessoas especiais que vivem num conto de fadas. Precisamos fugir das reuniões de oração! e nada de ficar chocados irmãos. O fato é que tem cristãos que oram de mais e vivem de menos. Vamos encarar a realidade. Vamos encarar, literalmente, a nossa realidade. A realidade à nossa volta, a realidade do mundo. Precisamos de outros ares que não o sufocante encontro ritualista dos nossos dias. Vamos ter outros amigos, ler outros livros; ver outros filmes, ouvir outras músicas (no final tem uma sugestão pra você); sair enfim dos nossos mesmos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares, como disse o poeta e como Matrix mostrou no episódio 1. Precisamos aprender a chorar por um amor não correspondido em vez de tentar justificar dizendo que não era a vontade de Deus. A chorar por tantos desabrigados, carentes, sem teto, sem família, sem nada; ou mesmo pelos ricos que governam nosso país. Precisamos ser mais solidários com a realidade do nosso mundo; seus problemas, suas necessidades. Cadê a igreja, que não se pronuncia? Cadê a gente, que não faz diferença, que não ilumina, mas vive fechado nos templos de ar-condicionado e cadeiras confortáveis. Ah, estamos tão fechados em nós mesmos também. Não queremos nos ferir, não queremos sair da zona de conforto. Não queremos gastar nossos corpos, nossa pele que cuidamos tanto. Temos tantos sonhos não é? Somos tão jovens. temos medo de envelhecer, das responsabilidades, ou de qualquer coisa que exija mais daquilo que estamos acostumados a dar. 

Ah meus irmãos, estamos tão errados! Tão longe! Não é à toa que a bíblia fala e dá destaque às impossibilidades humanas. Faz parte da vida a incapacidade humana. A fragilidade do homem, as exigências cada vez maiores , a tomada de decisões tão importantes! Não recue! Não decida viver em fantasias. Para Lucas, Zacarias e Isabel estavam preparados. Mas observe: existiam outros preparados também! Nosso casal não é especial (eles se tornaram especiais!). Eles não são melhores que os outros. A própria mãe do Salvador saiu de um lugar de onde menos se esperava. A vida é cheia de más justamente por isso, para que a glória seja de Deus e não nossa. Para que Cristo apareça! E não é necessário ter algum poder ou falar a lingua dos anjos. Quem te falou que Deus procura homens poderosos? Não! Ele procura gente humilde. Ele procura pessoas sinceras como esse casal, que ora na esperança de uma intervenção divina. Mas que também tenta, com sinceridade, vencer os desafios da vida. Lucas, na sua preparação para a entrada do messias, nos mostra claramente que mais importante que reuniões de oração ou labaredas de fogo é uma vida sincera diante de Deus. Não poupemos nossos corações, ou nossos pés, ou nossos braços, ou nossa pele, nossa vida enfim! Já dizia a música do Gonzaguinha: 














Eu acredito
É na rapaziada
Que segue em frente
E segura o rojão
Eu ponho fé
É na fé da moçada
Que não foge da fera
E enfrenta o leão
Eu vou à luta
É com essa juventude
Que não corre da raia
À troco de nada
Eu vou no bloco
Dessa mocidade
Que não tá na saudade
E constrói
A manhã desejada...
Aquele que sabe que é negro
O coro da gente
E segura a batida da vida
O ano inteiro
Aquele que sabe o sufoco
De um jogo tão duro
E apesar dos pesares
Ainda se orgulha
De ser brasileiro
Aquele que sai da batalha
Entra no botequim
Pede uma cerva gelada
E agita na mesa
Uma batucada
Aquele que manda o pagode
E sacode a poeira
Suada da luta
E faz a brincadeira
Pois o resto é besteira
E nós estamos pelaí...

Amém!

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